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quarta-feira, 7 de março de 2012

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Entrevista de Isabel Caetano ao Jornal O Jogo

Multicampeã é uma palavra que raramente se aplica a uma atleta. Entre as exceções está Isabel Caetano; ciclista portuguesa de 32 anos, metade dos quais "passados" em cima de uma bicicleta, sagrou-se campeã nacional de estrada, contra-relógio, BTT, ciclocrosse e pista. Casada com um ex-ciclista (José Dias), hoje seu treinador, é nele que encontra o maior motivador, mas também o mais sincero crítico.

Quando é que se sentiu uma predestinada para as bicicletas?

É algo que nasceu comigo. Adapto-me bem a qualquer variante do ciclismo e quando dou comigo estou a fazer bem as coisas, com toda a naturalidade.

Como é que descobriu esse talento inato?

Desde muito novinha que queria uma bicicleta para ir para a escola e tinha de trabalhar para a comprar. A minha mãe não tinha possibilidades e consegui concretizar esse sonho. Tinha 15 anos e o senhor Malta, dono de uma loja de bicicletas, disse à minha mãe que eu tinha muito jeito.

Foi assim que tudo começou?

Esse senhor perguntou-me se queria participar nos passeios de domingo de manhã, entre Vieira de Leiria e a Nazaré, e no primeiro emprestou-me uma "pasteleira". A partir daí, comecei a conviver com pessoas desse meio.

O seu marido é também o seu treinador. Conheceram-se no meio do ciclismo?

Eu corria no Sporting de Leiria e fui convidada a participar no Circuito da Moita, prova que reunia os profissionais, logo após a Volta a Portugal. Passados 300 metros já tinha ficado para trás. O José, que era o treinador de uma das equipas, passou por mim e disse: "Então rapariga, que vais aí a fazer? Anda cá para dentro." Foi a primeira e única vez que desisti. Fui para dentro da carrinha e fiz aí o resto da corrida. A partir desse dia mantivemos o contato; ele ia ver-me a Leiria e, passados três anos, fui viver para o Porto. Estamos casados há 14 anos.

Numa modalidade tão escrutinada, por causa da guerra às substâncias proibidas, pode dizer-se que o seu marido é o seu doping?

Sim, no fundo, é!

Isabel Caetano, ou simplesmente Marisa, entre os amigos e familiares, conquistou em 1996 o primeiro dos seus 16 títulos de campeã nacional. Para ela, "nenhum troféu é especial". "São todos iguais", reforça, antes de explicar ter aprendido que no ciclismo "temos de aprender a ganhar hoje, amanhã, para mostrarmos que somos boas". Os troféus estão numa estante envidraçada e as camisolas ficam em exposição uma semana, antes de irem para a gaveta. Qual a razão? "Não me deslumbro a olhar para aquilo que conquistei", justifica.

A bicicleta serve-lhe também para ir para o emprego. É respeitada pelos automobilistas?

Já ganhei uma defesa muito grande. Presto mais atenção a eles do que eles a mim.
Essa defesa quer dizer que é confrontada com alguma agressividade?
Sim. Ainda no último treino tive de dar um berro a um condutor para ele não me levar à frente. Eu ia atenta e ele ia na rotunda, mas não me viu. Devia ir stressado ou distraído.

Já sentiu medo várias vezes?

Nunca tinha sentido, até ter tido um acidente no ano passado. Agora tenho alguns medos.

Que se passou?

Ia a sair de casa para treinar e um carro abalroou-me. Atirou-me ao chão e pôs-se em fuga. Consegui ver a matrícula e o condutor, mais tarde, deu-se como culpado.
Ficou muito maltratada...
Estive 15 dias de cu virado para o ar [risos]. Afetou-me o cóccix, que é uma zona muito difícil de curar. O problema não foram os 15 dias de cama; foi que tinha uma prova com a Seleção, em França, um mês depois. Recuperei com muito sacrifício e força de vontade, cheguei menos bem preparada, mas fui a melhor portuguesa em seis dias a correr com as melhores do mundo.

Em competição já deu muitas quedas?

Não muitas. Tenho tido alguma sorte.

Para além do emprego na Garland Logística, onde trabalha oito horas/dia, Isabel Caetano treina três a quatro vezes por semana, e, periodicamente, vai a França representar a CSM Epinay. Quando questionada se tem tempo para fazer o normal do dia a dia de uma mulher - ir às compras ou ao cabeleireiro -, não revela qualquer complexo. A resposta surge de pronto: "Ao cabeleireiro vou muito raramente; talvez uma ou duas vezes por ano. Nas compras o meu marido ajuda-me. Não sinto a falta disso. Há 16 anos que esta é a minha vida."

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